O Rio Nilo é mais extenso do mundo, único no planeta a nascer no sul e correr para o norte ao longo de 6.550 quilômetros.
Foi nas margens do Nilo, férteis graças a suas cheias, que a civilização dos faraós floresceu e se mantém até hoje. Daqueles tempos, nessas mesmas margens, restam templos inesquecíveis. E é justamente por causa deles que o cruzeiro pelo Nilo se tornou um dos programas mais populares do país.
Existem vários tipos de roteiros, cobrindo mais ou menos templos, com duração de até sete noites. A bordo do navio Solaris II, operado pela Eagle Travel, singrei as águas do Nilo por três noites, saindo de Assuã com destino a Luxor.
O sentido contrário também é possível, mas leva uma noite a mais e, pessoalmente, eu acho que Assuã-Luxor ganha pontos por deixar o melhor para o final.
As vistas que se tem durante a navegação, porém, estão garantidas em qualquer itinerário. Os navios se movimentam apenas durante o dia; de noite, ficam atracados e têm programação de lazer a bordo.
No Solaris, cada grupo tem o acompanhamento de um guia fixo para todos os passeios, que, é bom saber, começam bem cedo, ainda de madrugada.
Cruzeiro no Nilo: por dentro do Solaris II
O navio Solaris II opera quatro roteiros pelo Nilo: o de três noites entre Assuã e Luxor; o de quatro, no sentido contrário; o de sete saindo de Luxor até Assuã e retornando a Luxor; e o de sete, saindo e voltando para Assuã.
A opção mais curta já dá conta dos principais passeios, que podem ser contratados em um pacote fechado – e também há alguns extras.
Ao todo, são 74 cabines espaçosas (mas antiguinhas) para até três pessoas, todas com varanda; na cobertura do navio, tem piscina com cadeiras para tomar sol. A diária começa em US$ 50 por pessoa e inclui café da manhã, almoço e jantar, servidos no restaurante a bordo em bufê.
A empresa Eagle Travel tem ainda outros dois barcos para cruzeiros no Nilo: o Solaris I e o Akhenaton.
Cruzeiro no Nilo -Dia 1: Assuã
O voo do Cairo até Assuã leva pouco mais de uma hora. Chegando de manhã e com as malas sendo encaminhadas direto para o navio, é possível aproveitar o dia na cidade, com passeios já incluídos no cruzeiro.
Ela fica no sul do país (área conhecida como Alto Egito), e serviu de fonte para muitas das pedras usadas na construção dos templos antigos, que eram transportadas pelo Rio Nilo.
Ela também é famosa pelas duas represas (alta e baixa) construídas ao longo do século 20 com o intuito de gerar energia e conter as cheias do rio, que causavam inundações frequentes, formando assim o Lago Nasser.
Foi para arcar com as despesas da Represa Alta, por sinal, que o governo egípcio nacionalizou o Canal de Suez nos anos 1950, entrando em um conflito com Israel, Inglaterra e França (a Guerra de Suez).
Outro ponto interessante para ver em Assuã é o Obelisco Inacabado – um monumento de 42 metros que não chegou a ser retirado da pedreira de granito rosa onde os egípcios antigos o talharam.
Templo de Philae
O ponto alto de Assuã, porém, é o Templo de Philae, uma bela amostra de tudo o que visitaremos nos próximos dias. Ele surpreende não só pela estrutura monumental, mas também pelo fato de ter sido transplantado nos anos 1990 para a atual localização em uma ilha no Lago Nasser.
Isso porque, em sua posição original, ele acabou inundado por conta da construção da barragem de Assuã. Com influência greco-romana, o templo foi construído no ano 680 a.C., em homenagem à deusa da fertilidade Ísis.
Segundo a mitologia, naquele mesmo ponto estaria enterrado seu irmão-marido Osíris, que morreu em uma armadilha preparada pelo outro irmão invejoso, Set.
Conta a lenda que as lágrimas de tristeza de Ísis causaram a primeira enchente do Nilo e que as imagens em que ela é representada com o filho Hórus deram origem à Virgem Maria com Jesus – de acordo com os entalhes na parede da sala do altar.
As marcas que estão sobre alguns dos desenhos originais foram obra de cristãos que buscavam destruir o paganismo egípcio – o templo chegou a ser transformado em igreja e ainda é possível ver o altar acrescido nessa época.
Passeios de barco e de camelo
Outro passeio oferecido pelo Solaris é a visita a uma vila do povo núbio – etnia negra originária dessa região do sul do Egito e do vizinho Sudão, uma das mais antigas civilizações africanas.
Para chegar lá, um passeio de barco revela túmulos escavados nas montanhas ao redor do rio; quem quiser também pode acrescentar um passeio de camelo. A vila é cheia de cores e movimento, com vendedores brotando de todos os cantos e barracas de artesanato ladeando a rua de terra cheia de camelos.
Na casa da família núbia, o anfitrião nos recebe com chá e pão, enquanto uma de suas quatro esposas se oferece para fazer tatuagens de hena que não necessariamente vão ficar muito bonitas (a cruz da vida no meu tornozelo que o diga).
Ele também exibe seu filhotinho de crocodilo, animal onipresente no Nilo e venerado no Antigo Egito. Não é um passeio imperdível e, como não está incluído no pacote padrão do cruzeiro, fica a seu critério fazê-lo ou não.
No fim deste dia, antes de finalmente embarcar no Solaris, ainda dá tempo de rodar um pouco pelo souk de Assuã – mas é verdade que, depois do passeio pelo Khan El Khalili do Cairo, o daqui pode não ser tão interessante assim. Não vai mal seguir para o navio e dormir cedo, pois o dia amanhã começa ainda de madrugada.
Cruzeiro no Nilo – Dia 2: Abu Simbel e Kom Ombu
A primeira noite de sono a bordo do Solaris dura pouco: logo às 4h, o grupo deve estar pronto para sair rumo a um dos monumentos mais impressionantes do Egito.
Madrugar é preciso porque a distância que faremos de ônibus será de quase 300 quilômetros a partir de Assuã (onde o navio atraca à noite). Além disso, devemos estar de volta na hora do almoço para que o cruzeiro comece.
Mas existe ainda outro motivo para a sair cedo: pode ser que haja a formação de um comboio com todos os veículos que partirão rumo a Abu Simbel, para terão escolta militar na travessia do deserto.
É uma medida de segurança contra terrorismo – aparentemente ocasional, porque não aconteceu no dia da minha visita. De qualquer forma, você também vai agradecer por ter vindo bem cedo e ir embora antes que o calor atinja o auge.
Explorando Abu Simbel
A chegada a Abu Simbel cria momentos de expectativa, já que é preciso caminhar uma pequena distância, contornando o templo maior, até avistar sua impressionante fachada. E quando ela finalmente aparece diante dos nossos olhos… uau!
É como uma versão egípcia de Petra, na Jordânia: são dois templos escavados em uma montanha rochosa a mando de Ramsés II. Com mais de 30 metros de altura, o maior é uma homenagem a ele mesmo e aos deuses Rá, Ptah e Amon.
O menor reverencia Nefertari, a esposa preferida do faraó (que teve várias mulheres ao mesmo tempo), e a deusa do amor Hator. É o único templo em que a estátua da rainha tem o mesmo tamanho que a do rei, ainda que haja mais estátuas dele do que dela.
O interior de ambos impressiona pelo ótimo estado de conservação dos hieróglifos – para fotografar, é preciso pagar bilhete extra.
Igualmente impressionante é saber que essa não é a localização original do complexo. Para evitar sua inundação com a criação da represa de Assuã na década de 1960, transportaram-no, pedaço por pedaço, para um terreno mais alto às margens do Lago Nasser, a 50 quilômetros da fronteira com o Sudão.
É o que podemos chamar, literalmente, de mover montanhas. Outro fato curioso é que todo ano, em 22 de fevereiro e 22 de outubro, um efeito natural faz com que a luz do sol ilumine apenas três das quatro estátuas no interior do templo maior – deixando no escuro apenas a de Ptah, deus do submundo.
Templo de Kom Ombu
Assim que os passageiros retornam de Abu Simbel, o navio finalmente apita e sai de Assuã para ganhar as águas do Nilo. No fim da tarde, chegamos à próxima parada: o Templo de Kom Ombu, dedicado ao deus-crocodilo Sobek e ao deus-falcão Horus.
O interessante de fazer a visita à noite fica por conta da iluminação, que dá um ar especial ao monumento.
Datado de 180 a.C., tem como destaque as paredes com inscrições que remetem a fórmulas farmacêuticas e receitas médicas e também ao calendário usado naquele tempo. Outro ponto curioso a ser observado é o nilômetro, um poço que servia para medir a cheia do Nilo e, assim, definir o imposto cobrado sobre a colheita da temporada.
O passeio termina com o pequeno museu vizinho, onde há cerca de 20 múmias de crocodilos – animais sagrados para os antigos egípcios. De volta ao navio, é hora de continuar a navegação rumo à cidade de Edfu, onde passaremos a noite atracados.
Cruzeiro no Nilo – Dia 3: Templos de Edfu e de Luxor
O dia começa cedo mais uma vez. Saindo do navio ainda no escuro, embarcamos em charretes para um trajeto rápido até o Templo de Edfu, um dos mais bem conservados do Egito. Construído por volta de 240 a.C. em homenagem aos deuses Horus e Hator, já com influência greco-romana, ele é possui muralhas altíssimas, que alcançam quase 40 metros.
Abandonado ao longo dos séculos e soterrado por areia, acabou sobreposto por moradias de habitantes locais até o século 19, quando começaram a restaurá-lo. Uma das salas, que servia como laboratório, traz inscrições sobre a produção das essências perfumadas que eram usadas como oferendas aos deuses.
Luxor: o grand finale
Depois de Edfu, o Solaris II segue para o trecho de navegação mais longo do roteiro. Só no fim da tarde aportamos em Luxor, o grand finale que reserva as melhores atrações da viagem para esta noite e a manhã seguinte.
Antes conhecida como Tebas, Luxor era a capital do Egito Antigo durante o Império Novo e hoje o conjunto de ruínas e tumbas que testemunham sua era de ouro é tombado como Patrimônio da Humanidade pela Unesco.
Já está escuro quando temos o primeiro vislumbre de todo esse esplendor, lindamente iluminado. É o Templo de Luxor, um dos maiores do país.
Ele começou a ser construído em 1400 a.C. em homenagem ao deus Amon e sua esposa Mut. Ganhou ainda mais imponência no reinado de Ramsés II (sempre ele), que é representado nas duas estátuas na entrada do templo.