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‘Zona de Interesse’ faz retrato obscuro e perturbador do Holocausto

Novo filme de Jonathan Glazer, que acaba de chegar aos cinemas, apresenta família alemã ao som dos gritos de terror em Auschwitz

VEJA SP | Por Mattheus Goto | 19 fevereiro 2024, 09h18 - Publicado em 16 fevereiro 2024, 06h00


✪✪✪✪ Há um turbilhão de pensamentos que passa pela mente ao assistir Zona de Interesse. O novo filme do diretor Jonathan Glazer não é nada frugal, por uma série de motivos. Para começar, a primeira cena confronta o espectador consigo mesmo, ao deixá-lo perante uma tela totalmente preta, com sons indistinguíveis, mas perturbadores. O breu abre espaço para a imaginação.

Em seguida, somos apresentados a uma família fazendo um piquenique à beira de um rio. O longa acompanha Rudolf Höss (Christian Friedel) e sua esposa, Hedwig (Sandra Hüller), até sua casa, vizinha a Auschwitz. Ele é comandante do campo de concentração e está comemorando seu aniversário. Os acontecimentos seguintes incluem uma festa, sua transferência para outra cidade e um caso de traição. Mas o filme vai muito além da narrativa apresentada na tela. É o som e a estrutura que arrasam o espectador.

Por trás da serenidade na rotina da família alemã, estão os gritos de terror e a morte violenta de milhares de pessoas fora de cena, no campo de concentração. Você não vai ver nenhuma cena de violência, mas vai ouvir. Tudo isso enquanto a família se diverte em um dia de sol no quintal com piscina. A linha do horizonte, inclusive, mal atravessa os muros da casa. Nos resta conviver com essa família e, assim como ela, banalizar a crueldade.

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Sandra Hüller no papel de Hedwig, em 'Zona de Interesse'

Sandra Hüller no papel de Hedwig, em ‘Zona de Interesse’

Outra escolha do diretor, que obriga o espectador a pensar, é a de enquadramentos estáveis e distantes. São poucos os momentos em que há movimentos das câmeras. Em vez de um convite caloroso a conhecer seus personagens, o longa repele, colocando-nos no posto de meros observadores. Isso gera a sensação de frieza e falta de proximidade com os personagens — deixando claro, também, a visão política do diretor sobre a situação histórica.

Para completar, Glazer emprega uma sequência de cortes abruptos, que apresentam uma menina em uma realidade paralela. Em um contraste com todo o restante do filme — não só pelo uso de visão noturna —, as situações fictícias e fabulosas fazem refletir sobre a vida, a guerra e a juventude.

Zona de Interesse é um filme que disseca o Holocausto sem tocar. A abordagem de Glazer ao tema da Segunda Guerra Mundial, tão revirado em Hollywood, se mostra surpreendente e necessária. E, de fininho, tem grandes chances de levar mais de uma estatueta do Oscar para casa (está indicado em cinco categorias).

Além dos acontecimentos: força de 'Zona de Interesse' está na estrutura

Além dos acontecimentos: força de ‘Zona de Interesse’ está na estrutura

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Publicado em VEJA São Paulo de 16 de fevereiro de 2024, edição nº 2880

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